RO: 01001176720215010015

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EMENTA – RECURSO ORDINÁRIO. INÉPCIA DA PETIÇÃO INICIAL. DIREITO À EMENDA. A possibilidade de declaração da inépcia da petição inicial justifica-se nos princípios mais basilares do processo, pelos quais as partes devem ser tratadas em igualdade de condições e devem poder exercer, de forma ampla, o direito de formular resposta adequada às pretensões que lhes são apresentadas em juízo. Verificando-se, porém, que a petição inicial, não oferece condições satisfatórias para a correta compreensão da lide pelo órgão julgador, deve ser concedido prazo para emenda da petição inicial, por se tratar de direito subjetivo do autor. A imediata declaração da inépcia, sem a concessão do prazo para emenda, importa violação a esse direito e à ampla defesa. Sentença que se anula por contrariedade com a Súmula nº 263 do C. TST e com o art. 284 do CPC de 1973, então vigente, atual art. 321 do CPC de 2015. Recurso provido .

Inteiro Teor

PODER JUDICIÁRIO

PROCESSO nº 0100117-67.2021.5.01.0015 (RORSum)

RECORRENTE: MARILUCE SILVA DE ANDRADE

RECORRIDO: ANA TERESA JARDIM REYNAUD

RELATOR: MÁRIO SÉRGIO M. PINHEIRO

EMENTA

RECURSO ORDINÁRIO. INÉPCIA DA PETIÇÃO INICIAL. DIREITO À EMENDA. A possibilidade de declaração da inépcia da petição inicial justifica-se nos princípios mais basilares do processo, pelos quais as partes devem ser tratadas em igualdade de condições e devem poder exercer, de forma ampla, o direito de formular resposta adequada às pretensões que lhes são apresentadas em juízo. Verificando-se, porém, que a petição inicial, não oferece condições satisfatórias para a correta compreensão da lide pelo órgão julgador, deve ser concedido prazo para emenda da petição inicial, por se tratar de direito subjetivo do autor. A imediata declaração da inépcia, sem a concessão do prazo para emenda, importa violação a esse direito e à ampla defesa. Sentença que se anula por contrariedade com a Súmula nº 263 do C. TST e com o art. 284 do CPC de 1973, então vigente, atual art. 321 do CPC de 2015. Recurso provido .

I – RELATÓRIO

Vistos, relatados e discutidos os presentes autos de recurso ordinário, em que são partes MARILUCE SILVA DE ANDRADE , como Recorrente e ANA TERESA JARDIM REYNAUD , como Recorrido.

Trata-se de recurso ordinário interposto pela reclamante, ID a348adc , contra a sentença da MM. 15ª VARA DO TRABALHO DO RIO DE JANEIRO, de lavra do Juiz CARLOS EDUARDO DINIZ MAUDONET , ID 3435921, que extinguiu o feito sem resolução do mérito, por inépcia da inicial.

A reclamante pretende que seja anulada a sentença e que lhe seja deferido prazo para emendar a inicial.

Sem contrarrazões.

Os autos não foram remetidos ao Ministério Público do Trabalho, em virtude do disposto no artigo 20 da Consolidação dos Provimentos da Corregedoria-Geral da Justiça do Trabalho, assim como do Ofício nº 472/2018 da PRT-1ª Região.

II – FUNDAMENTAÇÃO

ADMISSIBILIDADE

Conheço do recurso por presentes os requisitos de admissibilidade.

MÉRITO

DA PRELIMINAR DE NULIDADE POR CERCEAMENTO DE DEFESA

A sentença de piso extinguiu o feito por inépcia da inicial, nos seguintes termos:

considerando-se os termos do Ato nº 092/08, publicado no Diário Oficial do dia 05 de novembro de 2008, mormente o disposto no seu art. 2º e ainda, diante da facilidade e rapidez de se ajuizar nova demanda no sistema do PJ-e, e evitando-se futura alegação de nulidade do feito, na forma dos artigos 794 e seguintes da CLT ou até mesmo erro sistêmico face a ausência de informações consideradas como essenciais para o fluxo processual, nos moldes da Resolução 185/2017, do C. CSJT, indefiro a exordial (inteligência do CPC, arts. 320; 321 e 330, IV), com a consequente extinção do processo sem resolução, na forma do CPC, art. 485, I, tendo em vista a ausência do número do PIS /PASEP ou do NIT , da data de nascimento da autora (art. 2º, E e G do aludido normativo regional).

O Recorrente pleiteia a anulação da sentença por cerceamento de defesa, sob a alegação de que a extinção do feito por inépcia não prescindiu da abertura de prazo para emenda à petição inicial, à luz do art. 284 do CPC.

Razão lhe assiste.

Não se nega que, para cada pretensão (pedido) dirigida à parte em face de quem se vindica a tutela do Estado deve haver uma motivação (causa de pedir), sob pena de inépcia da inicial (art. 295, § único, inciso I, CPC). A inépcia igualmente ocorre quando a narração dos fatos pelo demandante é de tal modo genérica que impede o exercício regular do direito de defesa e a correta compreensão da lide pelo órgão julgador. Do mesmo modo é inepta a peça jurídica que carece de logicidade. Isto tudo justifica-se, evidentemente, nos princípios mais basilares do processo, pelos quais as partes devem ser tratadas em igualdade de condições e devem poder exercer, de forma ampla, o direito de formular resposta adequada às pretensões que lhes são apresentadas em juízo.

O processo é dialético. E se o Autor da ação inviabiliza tal dialeticidade, frustrando, em última análise, o exercício da ampla defesa e do contraditório, o provimento que essa conduta reclama é, sem dúvida, a declaração da inépcia do pedido com a consequente extinção do processo sem resolução de mérito. Não se trata, assim, de medida de caráter punitivo, mas, tão somente, de provimento assecuratório do exercício das garantias constitucionais do processo.

Entretanto, a simples declaração da inépcia, sem a concessão da oportunidade, ao autor da ação, para o saneamento das imperfeições da petição inicial importa violação à ampla defesa, não bastasse o desalinho com o entendimento já sumulado pelo C. TST no verbete de nº 263, recentemente alterado, verbis:

“SUM-263 PETIÇÃO INICIAL. INDEFERIMENTO. INSTRUÇÃO OBRIGATÓRIA DEFICIENTE (atualizada em decorrência do CPC de 2015)- Res. 208/2016, DEJT divulgado em 22, 25 e 26.04.2016

indispensável à propositura da ação ou não preencher outro requisito legal, somente é cabível se, após intimada para suprir a irregularidade em 15 (quinze) dias, mediante indicação precisa do que deve ser corrigido ou completado, a parte não o fizer (art. 321 do CPC de 2015).”

Observemos que a novel redação da Súmula em tela é ainda mais rigorosa quanto à hipótese de extinção por inépcia, ao determinar que o julgador deverá indicar de forma “precisa” o “que deve ser corrigido ou completado”.

Com efeito, a declaração da inépcia com a consequente extinção sem resolução de mérito é provimento que se emite com muito mais justiça e segurança, se, após devidamente intimado para sanar o vício, o Autor quedar-se inerte. O entendimento que prevalece no Órgão de Cúpula desta Justiça do Trabalho é o de que a emenda da petição inicial é direito subjetivo da parte autora, o qual resta inexoravelmente violado quando a inépcia é declarada de plano, hipótese dos autos.

A esse respeito, é emblemático o seguinte aresto do C. TST:

“RECURSO DE REVISTA. […] EMENDA DA PETIÇÃO INICIAL ABERTURA DE PRAZO. Salvo nas hipóteses do art. 295 do CPC, o indeferimento da petição inicial, por encontrar-se desacompanhada de documento indispensável à propositura da ação ou não preencher outro requisito legal, somente é cabível se, após intimada para suprir a irregularidade em 10 (dez) dias, a parte não o fizer (Súmula/TST nº 263). […] 2. EMENDA DA PETIÇÃO INICIAL. ABERTURA DE PRAZO CONHECIMENTO. O reclamante sustenta que a manutenção da extinção do processo sem julgamento do mérito, por insuficiência de causa de pedir, sem que fosse concedido prazo para emenda da petição inicial, é inadmissível. Afirma que, tendo o juízo de primeiro grau verificado que faltava documento essencial para o julgamento da reclamação em que se pleiteava as diferenças da multa de 40% sobre o FGTS, deveria ter sido intimado o reclamante para que, no prazo de 10 dias, sanasse a irregularidade, sob pena de indeferimento da petição. Aponta violação aos artigos 282, III, 284 e 295, I e parágrafo único, I, do Código de Processo Civil, bem como contrariedade à Súmula/TST nº 263. […] De fato, o Tribunal Regional manteve a sentença de fls. 136/137, que por sua vez extinguiu o processo sem julgamento do mérito ao verificar que a petição inicial era inepta, por não possuir documento essencial para o julgamento da lide, qual seja, decisão judicial que lhe assegure o direito ao reajuste sobre os depósitos do FGTS decorrente das perdas dos planos econômicos. Assim, a par da discussão acerca da efetiva necessidade do referido documento para o julgamento da causa, tendo o juízo de primeiro grau assim considerado, deveria ter aberto prazo para que o reclamante procedesse à sua juntada, sob pena de violar o artigo 284 do Código de Processo Civil, que assim dispõe: Verificando o juiz que a petição inicial não preenche os requisitos exigidos nos arts. 282 e 283, ou que apresenta defeitos e irregularidades capazes de dificultar o julgamento de mérito, determinará que o autor a emende, ou a complete, no prazo de 10 (dez) dias. Interpretando tal dispositivo, esclarece Humberto Theodoro Júnior (Curso de Direito Processual Civil, vol. II, Rio de Janeiro: Forense, 1997, p.356.),”Quando a petição inicial apresentarse com lacunas, imperfeições ou omissões, mas esses vícios forem sanáveis, o juiz não a indeferirá de plano. Determinará que o autor a emende, ou a complete, no prazo de 10 dias (art. 284). Só se o autor não cumprir a diligência no prazo que foi assinado, é que o juiz, então, indeferirá a inicial (art. 284, parágrafo único). Entende-se por petição inicial defeituosa e carente de saneamento aque não preenche os requisitos exigidos pelo art. 282, a que não se faz acompanhar dos documentos indispensáveis à propositura da ação,ou a que apresenta defeitos e irregularidades capazes de dificultar o julgamento de mérito (art. 284).”[…] Ressalte-se, ainda, que a abertura de prazo para emenda da petição inicial não decorre de poder discricionário do juiz, mas sim de direito subjetivo do jurisdicionado . Neste sentido, a doutrina de Nelson Nery Júnior ( Código de Processo Civil Comentado e Legislação Extravagante: 6ª ed. revista atualizada e ampliada. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2002, p. 641):” A emenda da petição inicial é direito subjetivo do autor. Constitui cerceamento desse

direito, portanto de defesa ( CF 5º XXXV e LV), o indeferimento liminar da petição inicial, sem dar-se oportunidade ao autor para emendá-la, em sendo a emenda possível .”Corroborando tal entendimento, a doutrina de Pontes de Miranda (Comentários ao Código de Processo Civil, tomo IV: arts. 282 a 443, Rio de Janeiro, Forense, 1996. pág. 28):”Tem o juiz de ler e examinar, com toda atenção, a petição, para verificar se foram satisfeitas as exigências constantes do art. 282 e 283. Se há defeitos, omissões, irregularidades e dúvidas, que lhe possam dificultar o julgamento do mérito e de alguma decisão que tenha ou possa ter de tomar o juiz, cabe-lhe determinar que o autor a emende, ou complete, ou esclareça, no prazo de dez dias. Convém e é dever do juiz que assim proceda ao ser-lhe apresentada a petição inicial, porém isso não obsta a que, tendo deferido a petição inicial, depois tenha de exigir que o autor satisfaça o que é necessário ou útil para o julgamento .”Por fim, a Súmula nº 263 desta Corte, que pacificou entendimento no sentido de que só é possível o indeferimento da petição inicial após a concessão do prazo […]. Ante o exposto, conheço do recurso de revista por contrariedade à Súmula nº 263 desta Corte. […] (NUMERAÇÃO ANTIGA: RR – 2646/2000-008-05-00; PUBLICAÇÃO: DEJT -09/10/2009; ACÓRDÃO 2ª Turma; Ministro Relator RENATO DE LACERDA PAIVA)

No caso, entendo que houve colisão com a Súmula nº 263 do C. TST, além de violação ao art. 284 do CPC de 1973, então vigente, atual art. 321 do CPC de 2015, não bastasse que o princípio da instrumentalidade das formas passou ao largo do provimento contra o qual investe o recorrente.

Isto posto, dou provimento ao recurso para, anulando a sentença, determinar o retorno dos autos à Vara de origem, a fim de que, após concedido prazo ao Autor para emenda da petição inicial, prossiga o Juízo a quo na instrução e julgamento do feito como entender de direito.

III – DISPOSITIVO

A C O R D A M os DESEMBARGADORES DA 1ª TURMA DO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 1ª REGIÃO, por unanimidade, CONHECER do recurso e, no mérito DAR PROVIMENTO ao recurso para, anulando a sentença, determinar o retorno dos autos à Vara de origem, a fim de que, após concedido prazo ao Autor para emenda da petição inicial, prossiga o Juízo a quo na instrução e julgamento do feito como entender de direito, consoante fundamentação supra, nos termos do voto do Desembargador Relator.

Rio de Janeiro, 11 de maio de 2021.

Mário Sérgio M. Pinheiro

Desembargador do Trabalho

Relator

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