RO 0000923-57.2017.5.06.0351

RO 0000923-57.2017.5.06.0351

EMENTA RECURSO ORDINÁRIO OBREIRO. EMPREGADA DOMÉSTICA E BABÁ. ACÚMULO DE FUNÇÕES. NÃO RECONHECIMENTO. Na acepção legal do art. 1º da lei 5.859/72, que disciplina a profissão de empregado doméstico, este é o que presta serviços de natureza contínua e de finalidade não lucrativa à pessoa ou à família no âmbito residencial destas. Assim, as tarefas relativas aos afazeres da casa e as relacionadas aos cuidados com a criança no âmbito familiar são de idêntica natureza jurídica, não havendo que cogitar em acúmulo de funções. Recurso improvido, no ponto.

Inteiro Teor

Consulta de Acórdãos – Inteiro teor

PODER JUDICIÁRIO

JUSTIÇA DO TRABALHO

TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 6ª REGIÃO

Identificação

PROCESSO TRT – Nº 0000923-57.2017.5.06.0351 (RO)

ÓRGÃO JULGADOR : PRIMEIRA TURMA

RELATOR : DESEMBARGADOR EDUARDO PUGLIESI

RECORRENTE : MARIA MARQUES DE MELO

RECORRIDOS : JANE MARIA MOREIRA DO AMARAL, PATRÍCIA MOREIRA DO AMARAL, ROOSEVELT DO AMARAL COSTA NETO, MÁRIO CÉSAR ALVES BARBOSA

ADVOGADOS : MÁRIO FILIPE CAVALCANTI DE SOUZA SANTOS, FLAVIA SANTOS DE LIMA, DIEGO BRANDAO BEZERRA E EDUARDO JOSE DE ALMEIDA RODRIGUES

PROCEDÊNCIA : VARA ÚNICA DO TRABALHO DE GARANHUNS/PE

EMENTA

RECURSO ORDINÁRIO OBREIRO. EMPREGADA DOMÉSTICA E BABÁ. ACÚMULO DE FUNÇÕES. NÃO RECONHECIMENTO. Na acepção legal do art. 1º da lei 5.859/72, que disciplina a profissão de empregado doméstico, este é o que presta serviços de natureza contínua e de finalidade não lucrativa à pessoa ou à família no âmbito residencial destas. Assim, as tarefas relativas aos afazeres da casa e as relacionadas aos cuidados com a criança no âmbito familiar são de idêntica natureza jurídica, não havendo que cogitar em acúmulo de funções. Recurso improvido, no ponto.

RELATÓRIO

Vistos, etc.

Recurso Ordinário interposto por MARIA MARQUES DE MELO, de decisão proferida pela Vara Única do Trabalho de Recife, que julgou parcialmente procedente a presente reclamação trabalhista, nos termos da sentença de ID f10c17f, movida em face de JANE MARIA MOREIRA DO AMARAL, PATRÍCIA MOREIRA DO AMARAL, ROOSEVELT DO AMARAL COSTA NETO, MÁRIO CÉSARALVES BARBOSA.

Em suas razões recursais (ID ad85385), a reclamante insurge-se contra o reconhecimento da prescrição bienal em relação ao reclamado Mário César Alves Barbosa para figurar no feito, bem como contra o indeferimento dos seus pedidos de acréscimo salarial decorrente de acúmulo de funções, multa pela retenção da CTPS, indenização substitutiva do seguro-desemprego e indenização por danos morais.

Sem contrarrazões, conforme certidão de ID 5db8f25.

O processo não foi enviado ao MPT para emissão de parecer, ante a ausência de obrigatoriedade (RI/TRT – 6ª Região, artigo 50).

É o relatório.

FUNDAMENTAÇÃO

VOTO:

Recurso da parte

Da ilegitimidade passiva do Sr. Mário César Alves Barbosa

De início, alega a reclamante, ora recorrente, argumenta que durante todo o lapso temporal que se estendeu de 1990 até 2006 esteve vinculada à família dos reclamados e que foi demitida e readmitida várias vezes porque os reclamados tentavam driblar a legislação trabalhista e que, assim sendo, não pode o Sr. Mário Cesar Alves Barbosa ser retirado do pólo passivo da demanda.

Pois bem.

Em sua defesa o reclamado Mário César Alves Barbosa argüiu prescrição bienal, tendo em vista que o contrato de trabalho firmado entre ele e a reclamante foi rescindido em 15/12/2007, enquanto que a presente reclamação somente foi ajuizada em 28/07/2017.

De fato, a Constituição Federal determina em seu art. 7º XXIX, que ação, quanto aos créditos resultantes das relações de trabalho, possuem prazo prescricional de cinco anos para os trabalhadores urbanos e rurais, até o limite de dois anos após a extinção do contrato de trabalho.

No presente caso, o vínculo laboral da autora com o reclamado Mário César se encerrou em 15/12/2007, conforme consta de sua CTPS, sendo a reclamação trabalhista proposta em apenas 28/07/2017. Assim, verificando-se que a presente ação não respeitou o prazo prescricional acima estabelecido, deve-se declarar a prescrição bienal, bem como a extinção do processo com resolução do mérito em relação ao referido reclamado.

Por fim, ressalto que, conforme anotação da CTPS, no período imprescrito, a autora teve sua Carteira de Trabalho assinada pela Sra. Patrícia Moreira do Amaral, contra quem deve prosseguir a presente reclamação, como bem entendido pelo juiz sentenciante.

Nada a reformar, portanto.

Do acúmulo de funções

Pretende a recorrente o reconhecimento do acúmulo das funções de doméstica e de babá, sob o argumento de que além de ter que cozinhar, lavar pratos e roupas, passar roupas, limpar a casa, assumia a função de babá.

Ressalta, ainda, que os serviços domésticos gerais não se confundem com a atividade de babá, pois as duas atividades envolvem atribuições e qualificações completamente diferentes.

O juízo de primeiro grau convenceu-se de que não houve prova do acúmulo de funções e que as atribuições da reclamante não eram incompatíveis com o contrato de trabalho, considerando-se a dinâmica organizacional de uma residência.

Ao exame.

O acúmulo de função se caracteriza pelo exercício de função diversa daquela para a qual o trabalhador foi contratado, com evidente sobrecarga de trabalho, de atribuições e responsabilidades, sem a paga correspondente, encerrando a ideia de alteração prejudicial das condições de trabalho (art. 468 da CLT).

Assim é que o exercício simultâneo de tarefas diferentes, executadas na jornada de trabalho, sem exigir maior capacitação técnica ou pessoal do empregado, compatíveis com a sua condição pessoal, não gera ao trabalhador o direito ao percebimento de um plus salarial.

O poder diretivo assegura ao empregador a possibilidade de conduzir a realização das atividades contratuais dos empregados para adequar a prestação do labor às necessidades do serviço.

Por conseguinte, na acepção legal do art. 1º da lei 5.859/72, que disciplina a profissão de empregado doméstico, este é o que presta serviços de natureza contínua e de finalidade não lucrativa à pessoa ou à família no âmbito residencial destas.

Diante desse contexto, entendo que as tarefas relativas aos afazeres da casa e as relacionadas aos cuidados com a criança no âmbito familiar são de idêntica natureza jurídica, não havendo que cogitar em acúmulo de funções.

Recurso improvido, no ponto.

Indenização substitutiva ao seguro-desemprego

Persegue a demandante uma indenização substitutiva do seguro-desemprego, alegando que os reclamados retiveram sua CTPS, o que a impossibilitou de requerer o seguro-desemprego dentro do prazo legal.

À análise.

Nos autos restou incontroverso a retenção da CTPS da autora, tendo em vista que, conforme consignado na sentença recorrida, tal documento só foi devolvido à reclamante após o ajuizamento da reclamação trabalhista, em 22/01/2018, ou seja, mais de um ano após a dissolução do vínculo trabalhista que ocorreu em 18/12/2016.

De acordo com os arts. 28 e 29, da Lei Complementar 150/2015, que dispõe sobre o contrato de trabalho do doméstico, para se habilitar ao benefício do seguro-desemprego, o trabalhador doméstico deverá apresentar ao órgão competente do Ministério do Trabalho e Emprego:

I – Carteira de Trabalho e Previdência Social, na qual deverão constar a anotação do contrato de trabalho doméstico e a data de dispensa, de modo a comprovar o vínculo empregatício, como empregado doméstico, durante pelo menos 15 (quinze) meses nos últimos 24 (vinte e quatro) meses;

II – termo de rescisão do contrato de trabalho;

III – declaração de que não está em gozo de benefício de prestação continuada da Previdência Social, exceto auxílio-acidente e pensão por morte; e

IV – declaração de que não possui renda própria de qualquer natureza suficiente à sua manutenção e de sua família.

Art. 29. O seguro-desemprego deverá ser requerido de 7 (sete) a 90 (noventa) dias contados da data de dispensa.

Assim, tem-se que a reclamante ficou impossibilitada de requerer o seguro-desemprego no prazo legal ante a retenção de sua CTPS pela reclamada, pois, conforme visto, a apresentação da CTPS ao órgão competente do Ministério do Trabalho e Emprego é requisito essencial para se habilitar ao referido benefício.

Portanto, restando suficientemente demonstrado que a recorrente sofreu prejuízos decorrentes da retenção indevida de sua CTPS, ante a impossibilidade de se habilitar para receber o seguro-desemprego, deve a reclamada ser condenada no pagamento de indenização substitutiva do referido seguro, em conformidade com o art. 26 da Lei Complementar nº 150/2015, a ser apurado em sede de liquidação de sentença.

Recurso obreiro provido, no ponto.

Da indenização por danos morais

A reclamante postulou o pagamento de indenização por danos morais, ao argumento de que conviveu por quase três décadas com a família dos recorridos e sempre teve por eles apreço e consideração, mas que se viu em situação vexatória ante a retenção dolosa de sua CTPS por mais de 01 ano, restando impossibilitada de requerer seguro-desemprego, bem como de pleitear colocação no mercado de trabalho. Alega, ainda, danos morais decorrentes da não quitação das verbas trabalhistas no prazo legal.

A pretensão autoral foi indeferida, ao fundamento principal de que a ausência de quitação de obrigações trabalhistas não enseja indenização por danos morais, uma vez que existe a possibilidade de reparar o dano mediante a imposição do pagamento devido com acréscimos legais.

No ponto, entendo que a decisão recorrida não merece reparos.

Para a caracterização do dano moral, é necessária a comprovação do preenchimento de cada um dos requisitos clássicos configuradores da responsabilização civil, a teor do que dispõe o art. 186 c/c 927 do Código Civil, quais sejam: ato lesivo (culpa empresarial), dano e nexo causal entre a conduta lesiva e o prejuízo alegado.

O fato isolado de ter sido demitida sem receber, de imediato, as verbas trabalhistas que faria jus, não implica no direito ao recebimento da indenização em apreço, pois a respectiva reparação pecuniária já lhe foi deferida na presente demanda, com os juros e a correção monetária devida.

Em relação ao fato da reclamada ter retido a carteira de trabalho da demandante, obstando a percepção do seguro-desemprego, também entendo que a recorrente teve tal prejuízo compensado com o deferimento da indenização substitutiva do seguro-desemprego, conforme decidido no tópico anterior.

Por fim, no que tange à alegação de impossibilidade de recolocação no mercado de trabalho, tal fato não restou provado nos autos.

Sentença que se mantém.

Da multa pela retenção da CTPS

Por fim, pleiteia a recorrente o pagamento de multa pela retenção indevida de sua CTPS. Embasa seu pedido no precedente normativo nº 98 da SDC – TST.

Pois bem.

Os precedentes normativos constituem a solidificação da jurisprudência dominante do Tribunal Superior do Trabalho em dissídios coletivos, editados com a finalidade de orientar as decisões em questões semelhantes e de forma a estabelecer o entendimento do TST sobre determinadas matérias. Logo, servem de orientação para futuras decisões judiciais, mas não possuem efeito vinculante.

Portanto, face ao contexto em que se originou o referido precedente (dissídio coletivo) e por não possuir efeito vinculante, no presente caso, entendo que o mesmo não deve servir como fonte de direito para imposição de penalidade ao empregador doméstico em sede de dissídio individual.

Por fim, não é demais frisar que, conforme restou anteriormente evidenciado, o único prejuízo experimentado pela autora, decorrente da retenção de sua CTPS, foi a impossibilidade de se habilitar no seguro-desemprego e tal prejuízo já foi devidamente compensado no tópico relativo à indenização substitutiva de referido seguro.

CONCLUSÃO

Ante o exposto, dou provimento parcial ao recurso para condenar a reclamada no pagamento de indenização substitutiva de seguro-desemprego, em conformidade com o art. 26 da Lei Complementar nº 150/2015, a ser apurado em sede de liquidação de sentença. Ao acréscimo remuneratório arbitro o valor de R$2.400,00 com custas majoradas em R$48,00.

Item de recurso

Conclusão do recurso

ACÓRDÃO

Cabeçalho do acórdão

Acórdão

ACORDAM os Desembargadores da Primeira Turma do Tribunal Regional do Trabalho da Sexta Região, por unanimidade, dar provimento parcial ao recurso para condenar a reclamada no pagamento de indenização substitutiva de seguro-desemprego, em conformidade com o art. 26 da Lei Complementar nº 150/2015, a ser apurado em sede de liquidação de sentença. Ao acréscimo remuneratório arbitra-se o valor de R$2.400,00 com custas majoradas em R$48,00.

Recife (PE), 07 de junho de 2018.

EDUARDO PUGLIESI

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