RO 01008161520175010301

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EMENTA DOMÉSTICA E CUIDADORA. EXERCÍCIO DE ATIVIDADES ACESSÓRIAS ÀS ATRIBUIÇÕES DO CARGO OCUPADO, DENTRO DA MESMA JORNADA DE TRABALHO. DESEQUILÍBRIO CONTRATUAL INEXISTENTE. ADICIONALINDEVIDO. O exercício de apenas algumas atribuições acessórias, dentro da mesma jornada de trabalho, não configura acúmulo de função, já que está encampado pela obrigação geral do empregado prevista no art. 456, parágrafo único, da CLT, que positiva o seu dever de colaboração. O adicional de acumulação somente é devido quando os afazeres não inerentes à função contratual do empregado são capazes de gerar desequilíbrio quantitativo ou qualitativo em relação aos serviços originalmente pactuados.

Inteiro Teor

PODER JUDICIÁRIO JUSTIÇA DO TRABALHO TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 1ª REGIÃO

PROCESSO nº 0100816-15.2017.5.01.0301 (RO)

RECORRENTE: GRAZIELA GOMES DE CARVALHO

RECORRIDO: OSMAR BEZERRA BORGES

RELATORA: CARINA RODRIGUES BICALHO

EMENTA

DOMÉSTICA E CUIDADORA. EXERCÍCIO DE ATIVIDADES ACESSÓRIAS ÀS ATRIBUIÇÕES DO CARGO OCUPADO, DENTRO DA MESMA JORNADA DE TRABALHO. DESEQUILÍBRIO CONTRATUAL INEXISTENTE. ADICIONALINDEVIDO. O exercício de apenas algumas atribuições acessórias, dentro da mesma jornada de trabalho, não configura acúmulo de função, já que está encampado pela obrigação geral do empregado prevista no art. 456, parágrafo único, da CLT, que positiva o seu dever de colaboração. O adicional de acumulação somente é devido quando os afazeres não inerentes à função contratual do empregado são capazes de gerar desequilíbrio quantitativo ou qualitativo em relação aos serviços originalmente pactuados.

RELATÓRIO

VISTOS , relatados e discutidos estes autos de RECURSO

ORDINÁRIO nº 0100816-15.2017.5.01.0301 , provenientes da MM. 1ª VARA DO TRABALHO DE

PETRÓPOLIS/RJ .

A Exma. Juíza do Trabalho, Dra. Rosangela Kraus de Oliveira

Moreli , pela r. sentença constante do ID d5524bc, cujo relatório adoto e a este incorporo, julgou

parcialmente procedentes os pedidos iniciais, reconhecendo o vínculo de emprego da autora com

o réu em data anterior à anotação em sua CTPS e determinando a respectiva retificação, bem

como o pagamento pela dobra das férias não usufruídas e do FGTS, a partir de outubro de 2015.

Inconformada, a autora se insurge.

A demandante manejou o recurso ordinário de ID 564f32d,

postulando a reforma da sentença no que tange ao acúmulo de função, às diferenças salariais, às

horas extras, à indenização por danos morais e aos honorários advocatícios.

Procuração, pela autora, no ID cbe6690.

Éo relatório.

FUNDAMENTAÇÃO

Conheço do recurso ordinário da autora, por preenchidos os requisitos de admissibilidade, observando-se o teor da certidão de ID c0034b2.

MÉRITO

DO ACÚMULO DE FUNÇÃO

Reitera a autora o pedido de plus salarial, no importe de 40% do valor da remuneração, em razão de alegado acúmulo de função. No ponto, afirma que teria sido contratada para exercer a função de cuidadora de uma idosa, Sueli, irmã do réu, sendo-lhe exigido no curso do contrato de trabalho que cuidasse de todos os afazeres da casa, atuando como faxineira, cozinheira e motorista. Aduz que as provas dos autos confirmariam a cumulação de tarefas, que violaria o sinalagma contratual.

O pedido foi indeferido sob a seguinte fundamentação:

De início, a matéria merece uma ressalva: a lei caracteriza como doméstico o profissional que presta serviços a pessoa física ou unidade familiar sem intuído de lucro, ou seja, qualquer atividade (seja motorista, cuidadora ou empregada doméstica) exercida em prol da família, ou seja, sem exploração de lucro é “empregada doméstica”. Deste modo, não cabe aqui o reconhecimento de acumulo de função, porque todas as tarefas foram prestadas em favor da mesma pessoa e dentro de um mesmo horário, portanto, incabível considerar-se que a autora executou tarefas não contratadas à teor do que dispõe o parágrafo único do art. 456 da CLT, por consequência, improcedem as diferenças salariais pretendidas.

Nada a reparar.

A autora foi contratada pelo réu em 10/06/2010, como reconhecido pelo juízo de primeiro grau, sendo o vínculo contratual encerrado em 10/06/2016, consoante anotado na CTPS (ID 0e9f494, página 03).

Éincontroverso que a autora laborava, efetivamente, como empregada doméstica, função anotada em sua carteira de trabalho. Contudo, ao contrário da narrativa autoral, o réu nega que ela tenha atuado como cuidadora, destacando que quando sua irmã precisou de cuidados especializados, contratou uma outra pessoa para essa função, no final do ano de 2015, a saber, a testemunha Lenita, que confirmou tal contratação em juízo (ID 0a1741f, página 02).

em determinadas ocasiões, utilizando-se de carro da família, e que tinha autorização para a retirada de medicamentos desta. Além disso, a testemunha Evani (ID 0a1741f, página 02) confirma que a acionante acompanhava Sueli ao hospital, em tratamentos e internações.

Contudo, não é qualquer acumulação de tarefas que gera direito a uma contraprestação adicional à remuneração pactuada entre as partes, mas apenas aquela que, efetivamente, acarreta um desequilíbrio no contrato de trabalho. Este é, aliás, o raciocínio contido no parágrafo único do art. 456 da CLT, verbis:

À falta de prova ou inexistindo cláusula expressa a tal respeito, entender-se-á que o empregado se obrigou a todo e qualquer serviço compatível com a sua condição pessoal.

In casu, as funções mencionadas pela autora para justificar o pedido de cumulação eram pontuais e estavam relacionadas à prestação de serviços à família, sem finalidade lucrativa, enquadrando-se no conceito de trabalho doméstico insculpido no art. 1º da Lei Complementar nº 150/2015. Além disso, eram incontroversamente realizadas dentro de sua jornada de trabalho e não demandavam qualquer especialização para seu exercício senão as já exigidas da profissional contratada.

A esse respeito, destaca-se o esclarecedor julgado:

ACÚMULO DE FUNÇÃO. DESEQUILÍBRIO CONTRATUAL INEXISTENTE. ADICIONAL INDEVIDO. O acúmulo de função gerador de diferenças remuneratórias é aquele que provoca desequilíbrio entre os serviços exigidos do empregado e a contraprestação salarial inicialmente pactuada, levando ao enriquecimento sem causa do empregador. Nesse passo, se os afazeres alegadamente “estranhos” à função do empregado não são capazes de proporcionar desequilíbrio quantitativo ou qualitativo em relação aos serviços originalmente prestados, é indevido o pagamento do vindicado adicional. (TRT da 3ª Região. Turma Recursal de Juiz de Fora. RO n. 0119300-9.2009.5.03.0143. Relator Desembargador José Miguel de Campos. DJ 26/04/2011)

Com efeito, o dispositivo legal supracitado positiva o dever de colaboração do trabalhador, não tendo sido provada a existência de nenhuma cláusula vigente entre as partes dispondo em sentido contrário.

Nesse contexto fático-jurídico, não há que se falar em acumulação de funções.

Nego provimento.

A demandante pretende o pagamento de diferenças salariais decorrentes da inobservância do piso salarial estadual.

A pretensão foi negada nos seguintes termos:

Feitos tais esclarecimentos, é de se reconhecer o vinculo empregatício na condição de empregada doméstica à partir de 10.06.2010, pois a defesa confirma o trabalho antes do registro na CTPS e o depoimento pessoal do réu corrobora esta certeza. Ocorre que a autora não fez qualquer prova seja de receber os R$500,00 além do recibo salarial , nem de que recebesse salários inferiores ao devido, valendo lembrar que não trouxe aos autos nenhuma Lei Estadual a prever o valor dos salários que pretendia, preclusão que obriga a considerar-se legitima a contratação pelo salário mínimo federal, restando improcedentes as diferenças a tal título, já que do ônus previsto no art. 8l8 da CLT a autora não se desincumbiu.

Merece reparo a sentença.

Com efeito, diante da nova realidade tecnológica, que proporcionou um exponencial aumento do acesso à informação, o novel art. 376 do CPC passou a prever que a prova do direito local ou estrangeiro somente será exigido da parte que o alega se assim o juiz determinar.

Nessa senda, a mera falta de juntada da lei estadual não pode fundamentar, por si só, o indeferimento da pretensão. De fato, não seria razoável tal procedimento quando as leis estaduais em comento podem ser facilmente encontradas por meio da rede mundial de computadores.

Pois bem, a autora afirma que recebeu, ao longo do contrato de trabalho, as seguintes remunerações, compatíveis com o salário mínimo federal:

2012 – R$ 622,00

2013 – R$ 678,00

2014 – R$ 724,00

2015 – R$ 788,00

2016 – R$ 953,00

A seu turno, o réu não trouxe aos autos qualquer recibo salarial, a despeito de sustentar o correto pagamento da remuneração, imputando à autora o ônus probatório de sua alegação.

Entretanto, é cediço que cabe ao devedor fazer prova do pagamento de suas obrigações, não servindo de escusa a alegação de que o vínculo empregatício não era

formalizado até o ano de 2015. Entendimento diverso seria permitir que o demandado se beneficiasse de sua própria torpeza.

No mais, não se pode olvidar que o réu admitiu, em seu depoimento pessoal (ID 0a1741f), que a autora recebia “salário mínimo federal”, declaração que não pode ser ignorada, a despeito da alegação declinada em contrarrazões de que ela teria sido fruto do nervosismo do depoente, ante a inexistência de outras provas de que foi observado o piso estadual durante todo o contrato de trabalho.

Note-se que o TRCT de ID 881b415, mesmo consignando o piso salarial estadual, não se presta, por si só, a tal fim, visto que sua capacidade probatória, isoladamente, se restringe às verbas rescisórias.

E a legislação estadual, de fato, prevê piso salarial maior que o salário mínimo federal durante todo o período imprescrito, senão vejamos:

Lei nº 6.163/2012 – R$ 729,58 (1º/02/2012)

Lei nº 6.402/2013 – R$ 802,53 (1º/01/2013)

Lei nº 6.702/2014 – R$ 874,75 (1º/01/2014)

Lei nº 6.983/2015 – R$ 953,47 (1º/01/2015)

Lei nº 7.267/2016 – R$ 1.052,34 (1º/01/2016)

Sendo assim, defiro à autora o pagamento de diferenças salariais resultante do cotejo entre o salário mínimo federal e o piso estadual.

Dou provimento para acrescer à condenação o pagamento de diferenças salariais.

DAS HORAS EXTRAS E DO INTERVALO INTRAJORNADA

A autora requer a condenação do réu ao pagamento de horas extras, inclusive pela supressão do intervalo intrajornada, argumentando que ele teria admitido o labor extraordinário ao afirmar, em seu depoimento pessoal, que, a partir de 2013, ela trabalhava das 7h às 16h, de segunda a sexta-feira, e das 7h às 12h aos sábados, além de não saber informar o tempo de pausa alimentar.

fundamentação:

A autora não fez provas de que tivesse trabalhado em feriados, muito menos que após junho de 2015 tivesse trabalhado além de 44 horas semanais, lembrando que a regulamentação da jornada do doméstico ocorreu no curso do contrato, restando improcedentes os pedidos de horas extras e feriados e seus reflexos.

Merece reparo a sentença.

Vê-se que o pedido recursal, em sua maior parte, está adstrito aos parâmetros declarados pelo próprio réu em seu depoimento, de modo que a jornada por ele declinada, ativada a partir do ano de 2013, das 7h às 16h de segunda a sexta-feira e das 7h às 12h aos sábados, resta incontroversa, sendo despicienda qualquer discussão acerca da obrigatoriedade do controle de horário.

Entretanto, a controvérsia subsiste no que concerne à fruição do intervalo intrajornada. E no ponto, a declaração de desconhecimento dos fatos pelo autor acarreta a pena de confissão, consoante disciplina dos artigos 385, § 1º e 386 do CPC, aplicável ao Processo do Trabalho por força do art. 769 da CLT.

Sendo assim, reconheço que a autora, a partir do ano de 2013 até a rescisão contratual, cumpria a seguinte jornada de trabalho: de segunda a sexta-feira, das 07h às 16h, e, aos sábados, das 7h às 12h, sempre com 15 (quinze) minutos de intervalo intrajornada.

Dessa forma, condena-se a ré ao pagamento, como trabalho extraordinário, do labor que ultrapasse a 44ª hora semanal, até o limite de 04 horas e 45 minutos semanais, considerando os limites do pedido recursal.

A condenação deve ser acrescida do pagamento de 01 (uma) hora extra por dia trabalhado em virtude da supressão da pausa alimentar.

Esclareço que resta superada pelo teor da Súmula nº 437 do C. TST a discussão concerne à natureza do intervalo intrajornada não gozado, forma de apuração e reflexos. Assim, a concessão parcial ou a não concessão do intervalo intrajornada mínimo, para repouso e alimentação, implica o pagamento total do período correspondente, e não apenas daquele suprimido, com acréscimo de, no mínimo, 50% sobre o valor da remuneração da hora normal de trabalho (art. 71 da CLT), sem prejuízo do cômputo da efetiva jornada de labor para efeito de remuneração. Da mesma forma, evidenciada a natureza salarial da parcela prevista no art. 71, § 4º, da CLT.

O trabalho excedente deverá ser remunerado com adicional de 50%.

O cálculo das horas extras deverá observar os seguintes parâmetros: (a) dias efetivamente trabalhados; (b) evolução salarial e (c) divisor 220.

No que toca à incidência de reflexos das horas extras habituais sobre os repousos semanais remunerados e sua consequente repercussão nas demais verbas tem-se que, recentemente, a maioria dos ministros que compõe a Seção de Dissídios Individuais I do TST, por ocasião do julgamento do IRR 10169-57.2013.5.05.0024, embora tenha suspendido a proclamação do resultado para submeter à apreciação do Tribunal Pleno a questão relativa à revisão ou cancelamento, se for o caso, da Orientação Jurisprudencial nº 394 SDI-1 do TST, votou de forma contrária ao disposto na referida Orientação Jurisprudencial, no sentido de “fixar, para o Tema Repetitivo nº 9, tese jurídica de observância obrigatória (arts. 896-C da CLT, 927, III, do CPC e 3º, XXIII, da Instrução Normativa nº 39/2015 do TST), enunciada nos seguintes termos:”A majoração do valor do repouso semanal remunerado, decorrente da integração das horas extras habituais, deve repercutir no cálculo das demais parcelas que se baseiam no complexo salarial, não se cogitando de ‘bis in idem’ por sua incidência no cálculo das férias, da gratificação natalina, do aviso prévio e do FGTS”.

Portanto, considerando que a maioria dos ministros já se manifestou em sentido contrário ao disposto na OJ nº 394 da SDI-I do TST, a qual somente adotava por disciplina judiciária, deixo de aplicar a aludida orientação.

Declaro a natureza salarial da verba, para fins do disposto no 832, § 3º, da CLT.

Dou provimento para condenar o réu ao pagamento de horas extras, inclusive pela supressão do intervalo intrajornada, e seus reflexos, nos termos da fundamentação.

DOS DANOS MORAIS

A autora requer o pagamento de indenização por danos morais, no importe de R$ 20.000,00, alegadamente decorrentes da inobservância de seus direitos trabalhistas, tais como a falta de formalização do vínculo de emprego, o excesso de jornada, o acúmulo de funções e a supressão de férias.

A sentença se encontra nos seguintes termos:

Cabia ao autor a prova de que houve constrangimento gerado pelo ambiente de trabalho ou por algum preposto do empregador, o que não veio a ocorrer, nem mesmo o assédio moral ficou provado, bastando para tanto que a declaração fornecida pelo Órgão previdenciário se deve não a omissão do empregador, mas decorrente de falhas no sistema de processamento do”e-social”que não indica na guia de recolhimento o nome do empregado, o que importa em que seja exigível a folha de cadastramento do empregado, mas isto não é culpa do empregador, nem constitui ato ilícito do empregador pudesse gerar o direito a reparação civil. Improcedem as indenizações por dano moral.

Ressalvando meu entendimento pessoal sobre o tema, tem-se que a questão do cabimento de indenização por danos morais em decorrência do inadimplemento das obrigações rescisórias e contratuais se encontra pacificada no âmbito deste Egrégio TRT com a edição da Tese Jurídica Prevalecente nº 01, in verbis:

TESE JURÍDICA PREVALECENTE – 01

DANO MORAL. INADIMPLEMENTO CONTRATUAL OU ATRASO NO PAGAMENTO DAS VERBAS RESILITÓRIAS. DANO IN RE IPSA E NECESSIDADE DE PROVA DE VIOLAÇÃO AOS DIREITOS DA PERSONALIDADE DO TRABALHADOR. Ainda que o dano moral seja in re ipsa, não é toda a situação de ilegalidade que é capaz de, automaticamente, causar um abalo moral indenizável. A situação de ilegalidade que constitui suporte para a indenização moral é aquela que impõe ao homem médio um abalo moral significativo. O dano moral não decorre, por si só, de mero inadimplemento contratual ou da falta de pagamento das verbas resilitórias pelo empregador, a não ser que se alegue e comprove ( CLT, art. 818 c/c do CPC/15, art. 373, inciso I) de forma inequívoca, o nexo de causalidade entre tal inadimplemento e a superveniência de transtornos de ordem pessoal dele advindos.

Como a autora não comprovou nenhum transtorno de ordem pessoal decorrente do não cumprimento de algumas obrigações contratuais, inclusive a formalização do vínculo de emprego, improcede o pedido de indenização por danos morais por esse motivo.

Note-se que não foi reconhecido o acúmulo ilegal de funções e que a jornada de trabalho admitida não pode ser considerada excessiva, a ponto de acarretar dano existencial à autora.

Nego provimento.

DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS

A autora requer o pagamento de honorários advocatícios, no importe de 15% sobre o valor da condenação, argumentando que o advogado seria figura essencial à administração da justiça, especialmente na sistemática do processo eletrônico, que teria retirado a efetividade da regra do jus postulandi.

A questão foi assim decidida em primeiro grau:

Defiro a gratuidade de justiça, mas indevidos os honorários advocatícios pretendidos, bem como a indenização por dano material, eis que o”jus postulandi”nesta Justiça Especializada não foi derrogado pelo art. 133 da CF ou mesmo pela Lei 8906\94, nem o autor é assistido por seu sindicato de classe.

Correta a sentença.

A CLT, em sua redação original, traz dois artigos a indicar critérios para a aplicação da lei no tempo. Dizem:

Art. 912 – Os dispositivos de caráter imperativo terão aplicação imediata às relações iniciadas, mas não consumadas, antes da vigência desta Consolidação.

Art. 915 – Não serão prejudicados os recursos interpostos com apoio em dispositivos alterados ou cujo prazo para interposição esteja em curso à data da vigência desta

Dada a singeleza com que questão foi cuidada pela CLT, sem que a Lei nº 13.467/2017 tenha propriamente indicado critérios para a aplicação da lei processual no tempo, impõe-se, com base no art. 769 da CLT c/c art. 15 do CPC, tomar de empréstimo o art. 14 do CPC, que diz:

Art. 14. A norma processual não retroagirá e será aplicável imediatamente aos processos em curso, respeitados os atos processuais praticados e as situações jurídicas consolidadas sob a vigência da norma revogada .

O CPC indica o acolhimento da teoria do isolamento dos atos processuais, sem retroação, para determinar a aplicação da lei vigente na data da prática do ato. Contudo, mitiga tal teoria em duas situações: (a) atos processuais praticados; (b) situações jurídicas consolidadas sob a vigência da lei revogada, adotando a teoria da autonomia das fases processuais (fase postulatória, fase instrutória, fase decisória, fase recursal e fase executória).

O art. 791-A da CLT traz uma significativa alteração no processo trabalhista para estabelecer os honorários advocatícios e a sucumbência recíproca, alterando substancialmente o cenário jurídico até então vigente e conduzindo o reclamante a um risco processual desconhecido e, portanto, imponderável ao tempo do ajuizamento da ação, em decorrência das novas regras.

Por outro lado, fixou-se em diverso cenário jurídico a relação material entre os advogados e seus clientes, que culminou com o contrato de prestação de serviços, sem que houvesse, por parte do advogado, qualquer expectativa de recebimento de honorários de sucumbência em reclamações trabalhistas fora das hipóteses consagradas até a alteração legislativa.

Como nos ensina PIERO CALAMANDREI, em sua clássica obra” O processo como jogo “, definia o processo como um jogo: com regras, jogadores, estratégias, táticas, recompensas e até um juiz. E, diz o autor, o fato de” decorar as regras do xadrez não torna ninguém enxadrista “. Em um processo justo, voltado ao acesso democrático à justiça, saber as regras habilitará o sujeito a jogar. Sendo que as condutas serão tomadas consoante as regras pré-estabelecidas para o jogo, ou seja, as regras pré-estabelecidas para o processo.

se de natureza híbrida – norma processual com efeitos materiais, descortina uma situação jurídica consolidada sob a vigência da lei revogada na fase postulatória , ao tempo do ajuizamento da ação, e, assim, não pode ser aplicada aos processos em curso nos termos do art. 14 do CPC.

Neste sentido, o magistério do Min. Maurício Godinho:

” Tratar-se-ia, pois, de uma situação fática e jurídica peculiar no ordenamento jurídico brasileiro, a qual recomenda, em vista da aplicação dos princípios constitucionais da segurança e da igualdade em sentido formal e material, além do próprio conceito fundamental de justiça, que se garanta a incidência dos efeitos processuais do diploma normativo novo somente para as ações protocoladas a partir do dia 13 de novembro de 2017. “(Mauricio Godinho Delgado, Gabriela Neves Delgado. A reforma trabalhista no Brasil: com os comentários à Lei n. 13.467/2017. São Paulo: LTr, 2017, p. 372)

Assim, considerando o contexto jurídico vigente por ocasião da propositura da presente demanda, não há embasamento legal para a condenação da ré ao pagamento de honorários advocatícios, nos termos do art. 14 da lei 5.584/70 e dos entendimentos consolidados na súmula nº 52 deste Regional e Súmula nº 219 do c. TST.

Com efeito, dois são os requisitos que tornam devidos honorários advocatícios da Justiça do Trabalho conforme previsto no dispositivo legal mencionado, cuja interpretação é dada pela Súmula 219 do TST: assistência pelo sindicato e encontrar-se a parte em situação econômica que não lhe permita demandar sem prejuízo próprio ou da família ou perceber menos do dobro do mínimo legal.

No caso em tela, a autora é assistida por advogado particular, o que se extrai da procuração de ID cbe6690.

Desse modo, a sentença deve ser mantida no particular

Nego provimento.

Conclusão do recurso

Conheço do recurso ordinário da autora, e, no mérito, dou-lhe parcial provimento para acrescer à condenação o pagamento de diferenças salariais, bem como de horas extras, inclusive pela supressão do intervalo intrajornada, e seus reflexos. Arbitro o valor da condenação em R$ 20.000,00 (vinte mil reais), com custas de R$ 400,00 (quatrocentos reais) pelo réu, parte sucumbente.

ACÓRDÃO

do Tribunal Regional do Trabalho da Primeira Região , na sessão de julgamento do dia 18 de junho de 2018, sob a Presidência do Exmo. Desembargador do Trabalho Rildo Albuquerque Mousinho de Brito, com a presença do Ministério Público do Trabalho, na pessoa na pessoa do Ilustre Procurador André Luiz Riedlinger Teixeira, dos Exmos. Desembargadores do Trabalho Carina Rodrigues Bicalho, Relatora, e Jorge Fernando Gonçalves da Fonte, em proferir a seguinte decisão: por unanimidade, conhecer do recurso ordinário da autora, e, no mérito, dar-lhe parcial provimento para acrescer à condenação o pagamento de diferenças salariais, bem como de horas extras, inclusive pela supressão do intervalo intrajornada, e seus reflexos, nos termos da fundamentação do voto da Exma. Desembargadora Relatora. Arbitrado o valor da condenação em R$ 20.000,00 (vinte mil reais), com custas de R$ 400,00 (quatrocentos reais) pelo réu, parte sucumbente.

CARINA RODRIGUES BICALHO

Relatora

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